Desde o início dos anos 1970, o Cmte. Fábio Goldenstein atua na aviação, acompanhando todo o processo de modernização do setor, incluindo as aeronaves, automação de procedimentos, novas tecnologias, melhorias em infraestrutura, entre outros avanços.
Ele passou mais de 34 anos de sua carreira na VARIG e, agora, já acumula 12 anos como comandante na Gol. Nessas décadas na aviação, pilotou desde aeronaves completamente analógicas, como DC-3 e Boeing 707, até exemplos de modernidade e pioneirismo em sua época. Ele foi um dos primeiros a pilotar o Boeing 767 na VARIG, ainda em 1988.
Teve atuação reconhecida como diretor de segurança do SNA, na investigação de acidentes aeronáuticos e nos debates sobre o tema. Foi eleito, em 1992, vice-presidente regional para o cone Sul da IFALPA, o primeiro brasileiro a ocupar o cargo.
Ouça a entrevista:
Confira a primeira parte da entrevista com o Cmte. Goldenstein:
ASAGOL – Quando começou o seu interesse pela aviação?
Cmte. Goldenstein - Sempre tive esse desejo. Eu sou do Rio de Janeiro e desde muito jovem já visitava oficinas de aviões no Aeroporto Santos Dumont. Eu gostava de ver as aeronaves, apesar de não ter uma familiaridade com o setor, pois nenhum parente ou amigo da família trabalhava na área.
Ainda criança eu já conhecia os modelos de aviões, características e peculiaridades, a paixão começou cedo. Um dia, já mais velho, com 17 anos, fui ao aeroporto e vi um piloto, disse a ele que também gostaria de ter essa profissão e perguntei o que era necessário.
Ele me levou a um guichê de uma escola de voo do aeroclube, em 1969, e esse foi o meu ponto inicial. Fiz a formação toda e completei as horas rapidamente com a ajuda da família.
ASAGOL – Como foi entrar no mercado da aviação, começar a trabalhar na área?
Cmte. Goldenstein - Naquela época era possível entrar nas empresas com pouca experiência. Em março de 1972 eu fui contratado pela VASP com apenas 220 horas de voo. Fiz a prova e passei em segundo lugar.
Como eu tinha pouca experiência, comecei como copiloto de DC-3 e operei os voos da VASP na região do Araguaia, Tocantins, Tapajós e linhas que ligavam Cuiabá a Rio Branco.
A empresa tinha uma rede de voos que atendia as regiões do Centro Oeste, Amazônia, Acre e Rondônia, passei o meu primeiro ano na aviação dessa forma. Eu me mudei para São Paulo e permanecia uma semana voando por essas áreas antes de voltar à cidade.
ASAGOL – Apesar de ter começado na VASP, a maioria de sua trajetória na aviação foi na VARIG, certo?
Cmte. Goldenstein - Sim, depois de um ano na VASP eu entrei na VARIG, empresa que trabalhei 34 anos da minha vida. Além de ser maior, a Varig me ofereceu a oportunidade de voltar para o Rio de Janeiro, minha cidade natal. Devido à minha pouca experiência, eu fui contratado para voar o Boeing 707, como 2º oficial, que revezava com os pilotos durante as longas rotas, mas não podia pousar ou decolar com os aviões. Era uma função que eu não gostava na época, mas hoje vejo que me deu muita experiência e conhecimento.
Eu tinha 21 anos e já viajava pelo mundo na VARIG, incluindo Estados Unidos, Japão, entre outros. Depois de alguns anos, fui promovido para copiloto de Boeing 727, passando a pilotar de fato, pousar e decolar, como era na VASP. Apesar de ser parecido com o modelo 707, essa aeronave era muito mais veloz e demandava bastante do piloto em sua operação manual, era um prazer enorme voar com ele, uma grande escola na aviação.
ASAGOL – E como foi a sua evolução nos anos seguintes na VARIG?
Cmte. Goldenstein - Foram dois anos como segundo oficial e seis como copiloto de Boeing 727. Depois, passei outros dois anos como copiloto de Electra L-188, um quadrimotor turboélice que marcou a Ponte Aérea Rio-São Paulo, rota que permaneci durante um tempo. Em seguida, fui promovido para comandante no Electra e voltei para o B-727 nessa mesma função em seguida.
A partir desse momento, quando me tornei comandante, as coisas foram acontecendo mais rapidamente. Em 1988 voei o Boeing 767, meu primeiro contato com a tecnologia digital EFIS – Eletronic Flight Instrument System. Em 1990, eu optei por voltar para os modelos analógicos e passei um período voando o DC-10 e o Boeing 747-300.
No início dos anos 2000 eu voltei aos modelos digitais com o MD-11 e encerrei a carreira na VARIG voando o Boeing 777. Foram mais de 34 anos de VARIG e, pouco depois, eu começava a minha trajetória na Gol Linhas Aéreas, onde estou até hoje.
ASAGOL – Como foi essa transição para a Gol, deixando a VARIG após tanto tempo?
Cmte. Goldenstein - A VARIG fechou as portas, deixei a empresa em 2006, quando encerraram as operações do B-777. Eu tive a oportunidade de entrar na Gol em 2007 e, até 2010, voei em todas as rotas da empresa, ainda na base São Paulo. Depois disso, solicitei a migração para o Rio de Janeiro e estou lá desde então.
É uma empresa boa, que estou há 12 anos, e me deu a oportunidade de continuar trabalhando na aviação.
Pretendo encerrar a minha carreira nos próximos anos, voando pela Gol.
ASAGOL – Como foi vivenciar décadas de evolução tecnológica na aviação?
Cmte. Goldenstein - Sou uma espécie de testemunha ocular e participativa da evolução tecnológica dos últimos 50 anos da aviação. Em meu início o voo não tinha apoio. Olhar a cabine de um DC-3 atualmente e comparar com os atuais percebemos uma enorme diferença de instrumentos e recursos.
Uma das principais mudanças foi na comunicação, que era muito precária antes do avanço tecnológico. Não havia rede de cobertura de rádio, existia um profissional chamado Rádio Operador de Voo (ROV) apenas para fazer esse trabalho, se comunicar por telegrafia. Eram apelidados carinhosamente de pica-paus, pelo som que o equipamento fazia.
Era tudo muito rústico, a maioria das pistas de terra, de piçarra, não havia aeroportos e sim campos de pouso, muito rudimentares. Eu cheguei a vivenciar o fim dessa época da aviação. Depois, a evolução das aeronaves, o início da era digital, a automação e a substituição de profissionais pelas tecnologias.
Após a extinção do ROV, foi a vez dos navegadores de voo se tornarem obsoletos. Na época a navegação era baseada em auxílios em terra (NDB´S e VOR´S) e esses profissionais utilizavam um sextante periscópico em voo para determinar a posição da aeronave por meio das estrelas, durante a noite, ou pelo sol, durante o dia. Os primeiros sistemas eletrônicos de navegação de longa distância (Doppler, Ioran, Ômega e, depois, inercial) extinguiram essa profissão. Inclusive, muitos eram ex-ROVs, que já tinham perdido a função anteriormente.
Outra função extinta com a tecnologia foi a do engenheiro de voo, que gerenciava os sistemas elétricos, hidráulicos, balanceamento do sistema de combustível e consumo dos tanques em um painel na cabine. Muita coisa mudou nessas décadas, buscando sempre o aumento da segurança e da rentabilidade das operações.
ASAGOL – Você também atuou na área de segurança de voo, poderia nos contar como foi essa experiência?
Cmte. Goldenstein - Sim, eu já fui da diretoria do SNA, atuei como diretor de segurança entre o final da década de 1980 e começo de 1990. Essa foi uma época em que o sindicato sentiu a necessidade de trazer um viés técnico às atividades e coincidiu com o início da redemocratização do país. Com a criação da nova assembleia constituinte, o sindicato ganhou espaço na investigação de acidentes aeronáuticos.
Como diretor da entidade, fiz o curso de investigação de acidentes do CENIPA. Pouco tempo depois obtive uma bolsa de estudos da ICAO para realizar o curso de investigação de acidentes aéreos do Cranfield Institute of Tecnology, na Inglaterra, promovido pelo AAIB – Britânico.
A partir dessa qualificação, passei a acompanhar as reuniões regulares dos comitês técnicos da IFALPA. Em 1992, em uma conferência realizada no Rio de Janeiro, eu fui eleito vice-presidente regional para o cone Sul da IFALPA, o primeiro brasileiro a ocupar o cargo. Fiquei até 1996 à frente desse setor e montamos um ótimo grupo de trabalho, com diversas associações participando. Pudemos produzir pesquisas, levantamentos, inspeção em aeroportos e contribuir na investigação de acidentes.
Automação na aviação
Na segunda parte da entrevista com o Cmte. Fábio Goldenstein falamos sobre a automação na aviação, incluindo as motivações para os avanços tecnológicos nessa área, seu conceito, o atual momento e possíveis problemas que podem ser gerados.
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Comandante Goldenstein. Exemplo de profissional e colega. Pra mim, um referencial. Grande abraço e bons voos.
Quanto tempo, Eustachio! Voce é da época do Aeroclube, antes da linha aérea... Gostaria de reve-lo!
Grande comandante é um amigo que há muito não o vejo.