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Compulsão pelo Voo

A aviação brasileira possui um cenário extremamente competitivo e isso afeta diretamente as estratégias operacionais das empresas aéreas. A busca incessante por uma maior eficiência cria uma atmosfera cada vez mais competitiva em termos de produção.


O dilema gerencial, que busca o equilíbrio entre a proteção e a produção, depende cada vez mais da interação humana com: tomada de decisão, assertividade, gerenciamento de conflitos, entre outros.

O desafio de equilibrar esse dilema depende também de qual fase a empresa se encontra em relação a sua implantação, expansão e consolidação. O tempo de mercado também influencia, pois a cultura organizacional envolve o processo de treinamento dos colaboradores e o grau de maturidade atingido pelo processo de trabalho do grupo.


Neste cenário, a equipe de safety trabalha para evitar que decisões impulsivas ou compulsivas possam colocar em risco a operação, como por exemplo: a não aderência aos procedimentos preconizados pela organização em busca de atingir metas.


O que é a impulsividade?


“São comportamentos ou respostas realizadas de maneira prematura, não havendo uma verdadeira análise de possíveis consequências, confluindo enormemente para resultados indesejáveis e até deletérios”

(Daruna, 1993)

O que é a compulsão?


As compulsões ou rituais compulsivos são os comportamentos repetitivos ou atos mentais os quais a pessoa se sente compelida a executar para diminuir a ansiedade e/ou desconforto associado às obsessões ou regras a serem seguidas rigidamente.


O importante a se compreender é que toda ação compulsiva é resultado de uma impulsividade, ou seja, ato voluntário (claramente excessivo) em resposta às obsessões as quais o indivíduo não consegue, na maior parte das vezes, resistir.


Atualmente se pensa em compulsão ao relacionar as ações dos tripulantes técnicos durante a fase de operação de pouso. Neste artigo resolvemos mudar um pouco o prisma para um novo evento que se destaca a cada dia, que é a “COMPULSÃO PELA ESPAÇO DECOLAGEM”.

Não é estranho imaginar um tripulante técnico “acelerado” em sua rotina de operações, porém cabe entender o motivo dessa necessidade de realizar as tarefas rapidamente.

O estudo dessa questão vem desde o pior desastre aéreo da aviação, entre uma aeronave da KLM e outra da Pan-Am em Tenerife. Entre as diversas ações realizadas foi criada uma Associação de Pilotos de Linha Aérea (ALPA) que – após conduzir uma investigação de 18 meses envolvendo três países – identificou um fator específico dentro de Fatores Humanos, classificando-o como: Hurry Up Syndrom.


A Síndrome de Hurry Up


Oficialmente conhecida por “qualquer situação que degrade o desempenho humano de um piloto por uma percebida/real necessidade de apressar tarefas ou obrigações por qualquer motivo”.


Ilustra-se essa síndrome ao se relacionar diretamente com a necessidade de manter a aeronave no trilho, pressões oriundas do CCO, ATC, manter o cronograma previsto (apesar das manutenções e meteorologia) e o dilema encontrado em relação à regulamentação do aeronauta.


Os fenômenos comportamentais na indústria aeronáutica apresentam atualmente uma nova tendência, que é a compulsão pelo voo ou mais especificamente a decolagem. Existe uma espécie de receio, entre esses profissionais, de atrasar a operação e consequentemente entrar num efeito cascata e prejudicar sistemicamente as operações.


De acordo com o psicólogo e especialista em Fatores Humanos, Bruno Blaya, “Hurry up syndrome é uma dinâmica organizacional ditada para o cumprimento dos prazos definidos por um mercado concorrido e superlotado, sendo o sistema da aviação sincrônico, onde a pressão de tempo vivenciada pelos colaboradores, por vezes declarada ou não, é priorizada em detrimento aos processos, resultando em erros, desvios ou violações”.


Dentro do cenário de novas oportunidades às ameaças, se deve fazer presente o trabalho corporativo a fim de mitigar possíveis falhas nos processos organizacionais, os quais envolvem não só os pilotos, como todas as categorias de trabalho envolvidas na operação. Além disso, em paralelo é fundamental que os colaboradores, principalmente aqueles que exercem atividades de risco à Segurança Operacional, tenham a consciência de que segurança está acima da pontualidade.


A compulsão pela decolagem além de facilitar as falhas ativas, aumenta o leque para situações que ultrapassem a capacidade humana dos envolvidos, a ponto de influenciar negativamente em uma operação, como no exemplo a seguir: “A tripulação fecha portas atrasada e durante o taxi out – em coordenação com o solo – é sugerida a decolagem de uma taxiway intermediária.

Após o aceite, a tripulação acelerou o processo de inserção de dados e o realizou de forma incorreta. Na pressa, os pilotos equivocadamente inseriram o Actual Zero Fuel Weight (AZFW) no lugar do Gross Weight (GW). Como consequência, a decolagem ocorreu com discrepância de peso e a aeronave saiu do solo no último terço da pista. Faltavam apenas poucos metros para a cabeceira oposta.


Este fato quase acarretou em um evento de runway excursion.” Exemplos como esse não são intangíveis e não devem ser considerados improváveis, pois, seguindo a premissa de que todo o acidente pode e deve ser evitado. Sendo assim, aumento na carga de trabalho ou qualquer outro fator que eleve a complexidade da operação, deve ser cuidadosamente executado e conferido, mesmo que isso necessite de mais tempo para a preparação.


Todos os envolvidos na operação aérea devem se policiar quanto às compulsões pela liberação e posterior saída das aeronaves. É necessário pôr em mente que a verdadeira prioridade é o nosso valor número 1, a SEGURANÇA!

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Sobre o Autor


Filipe Vasconcellos copiloto e Analista de Safety da GOL Linhas Aéreas.

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Texto originalmente publicado no ASAGOL Safety News 11. Para ler a edição completa clique aqui.

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