A ASAGOL estreia hoje mais um canal de entrevistas, dando continuidade ao projeto de trazer informação e histórias ligadas à aviação. Este novo espaço, denominado “Amigo da ASAGOL”, trará um bate-papo com especialistas da área, não necessariamente ligados à Gol ou à associação, mas com trabalhos importantes no setor.
No texto de estreia entrevistamos o Coronel Aviador Anderson da Costa Turola, chefe do SRPV-SP desde dezembro de 2017. Ele nos contou a sua história, começando com o desejo de ser um militar em sua infância até alcançar a liderança do maior órgão de controle de tráfego aéreo do país.
O Coronel detalhou os projetos realizados no SRPV-SP que trouxeram melhorias no fluxo dos aeroportos paulistas e cariocas, além da implantação da primeira torre virtual de todo o hemisfério sul, que entrará em operação em outubro.
Ouça o podcast:
Confira a entrevista na íntegra:
ASAGOL - Você tem uma longa trajetória na Força Aérea Brasileira (FAB), como surgiu o interesse em ingressar na carreira militar?
Cel. Av. Turola - Eu sou carioca e desde a minha infância eu tinha o desejo de ser militar. Conheci a FAB por meio de alguns primos meus, que se formaram na EEAR (Escola de Especialistas da Aeronáutica), na cidade de Guaratinguetá (SP).
Eu tinha cerca de 11 anos na época e fui à formatura deles, fiquei encantado, decidi naquele momento que era o que eu queria fazer.
Eu estudava em escola municipal, José Joaquim de Queiroz Junior, no Rio de Janeiro, sempre estudei, e aquele sonho era muito grande, uma meta bastante audaciosa.
ASAGOL - Quais foram as dificuldades que você superou nessa jornada até a FAB?
Cel. Av. Turola - Foram diversos desafios no caminho, pois o sonho era grande. Primeiro as restrições financeiras, não permitindo estudar em escolas particulares, quando eu estava entre a sétima e a oitava séries eu já trabalhava de jornaleiro em banca para ajudar em casa. Quando eu terminei o ensino fundamental, entrei em um curso preparatório para concursos militares, em Madureira. O grande sonho era ser aprovado na EEAR, que forma o corpo de graduados técnicos, os sargentos da FAB. Ainda não tinha a pretensão de ser um piloto e nem muita informação a respeito. Depois, ao estudar para o concurso público, comecei a entender melhor como funcionava e os caminhos existentes.
Em 1987, realizei um ano de curso saindo do ensino público, sem base nenhuma. Depois, fiz as provas para o Colégio Naval, EPCAR (Escola Preparatória de Cadetes da Aeronáutica), ESPCEX (Escola Preparatória de Cadetes do Exército) e a EEAR. Não fui aprovado em nenhuma delas, fiquei decepcionado, triste e recebi uma bela bronca do meu pai, pois foi um esforço de todos para que eu tivesse essa oportunidade de estudar.
Tive uma última chance no ano seguinte, no Curso Soeiro, em Cascadura, um curso preparatório mais conhecido no Rio de Janeiro e que aprovava bastante à época. Peguei pesado nos estudos e consegui a aprovação em dois concursos: na EEAR, turma Verde 89, e na EPCAR, turma 89.
ASAGOL - Como seguiu da aprovação para se tornar um aviador?
Cel. Av. Turola - Após as aprovações, o sonho começou a ficar mais tangível, mais real. Consegui passar no exame médico e me apresentei na EEAR, em Guaratinguetá. Passei pela quarentena, etapa de adaptação à vida militar, mas depois que a minha vaga foi confirmada na EPCAR eu pedi desligamento e me apresentei na nova escola.
Em meu segundo ano na EPCAR eu ainda não tinha a certeza de seguir para a Academia da Força Aérea (AFA), pensava em ir para o ESPCEX, pois na época eu ainda não me via como um futuro piloto militar.
Até os meus 18 anos eu nunca tinha entrado em um avião. Não tinha aquele desejo de ser aviador. Mas depois, quando eu voei pela primeira vez, tudo começou a mudar.
Foi em uma competição de atletismo que participei quando estava no 2º ano da EPCAR, representando a escola, e que foi realizada na Academia da Força Aérea, em Pirassununga.
Depois dessa primeira experiência eu pude vivenciar o ambiente da academia, os cadetes voando, as pistas, respirei aquele ar, entrei em contato com aquela aura dos aviadores. Decidi permanecer e, em 1992, ingressei na academia da FAB no curso de formação CFOAV (Curso de Formação de Oficiais Aviadores).
ASAGOL - Depois desse ingresso na FAB, como a sua carreira foi conduzida?
Cel. Av. Turola - Foram quatro anos de academia até concluir o curso. Fui declarado Aspirante a Oficial Aviador, em dezembro de 1995.
Nesse mesmo mês me casei com a minha amada esposa Valeska, que segue nessa caminhada ao meu lado me dando o suporte fundamental de uma família estruturada e feliz, juntamente com nossos filhos Andressa e Vitor.
Depois da formação, fiz uma especialização operacional na Base Aérea de Natal, onde fui bem avaliado e selecionado para a Aviação de Caça.
Fiz essa especialização como piloto ao longo de todo o ano de 1996, tendo sido qualificado como Ala Operacional da Aviação de Caça. Concluí a formação em Líder de Esquadrilha, no 1º/4º GAv na Base Aérea de Fortaleza, e atingi a operacionalidade nessa função. Comecei a atuar como Instrutor da Aviação de Caça, ao retornar à Base Aérea de Natal, em 1999. Todas essas etapas eu concluí na aeronave AT-26 Xavante, um ótimo modelo, robusto, jato, utilizado por muito tempo na FAB. Depois, dando continuidade à evolução operacional, saí do Xavante para o A-1 (AMX), outro caça excelente.
ASAGOL - Além dessa vivência no Nordeste, você atuou também em outras regiões do país?
Cel. Av. Turola - Sim, fui para a Base Aérea de Santa Maria no ano de 2002. Após anos morando no Nordeste, mudei completamente de ambiente indo residir no Sul do país. Eu saí da cidade após voar a primeira linha da Aviação de Caça. Foi nessa época que eu vislumbrei a possibilidade de atuar na área de controle do espaço aéreo. Em 2006, entrei no DECEA (Departamento de Controle do Espaço Aéreo) e comecei a conhecer melhor esse trabalho.
Nesse caminho como aviador, saí do Sul rumo ao Sudeste para atuar na área de controle do espaço aéreo, passando a voar na inspeção de voo no Rio de Janeiro por cerca de quatro anos. Depois, parti novamente rumo ao Nordeste, assumindo o cargo de Comandante do Destacamento de Controle do Espaço Aéreo de Natal - DTCEA-NT.
Também morei em Brasília, anos depois, onde exerci a função de chefe da Divisão de Operações do CINDACTA I, agora estou em São Paulo.
Em minha carreira, pude morar em diversas regiões do Brasil e até fora do país, onde pude realizar o curso de Comando e Estado Maior na Força Aérea Argentina e exercer a função de Adjunto do Adido de Defesa e Aeronáutico na Embaixada do Brasil.
ASAGOL - Como se desenvolveu a sua carreira após essa experiência no controle de tráfego aéreo em Natal?
Cel. Av. Turola - Após atuar como comandante do DTCEA-NT por dois anos, comandei o 3º Esquadrão do 1º Grupo de Comunicação e Controle, também em Natal, e também pude voltar à função de instrutor da Aviação de Caça, agora voando a aeronave A-29, Super Tucano da Embraer, tendo atingido a operacionalidade de Líder de Esquadrão da Aviação de Caça.
Outra experiência importante foi a participação na Sala Master de Comando e Controle do CGNA, durante a Copa do Mundo de 2014. Nesse ano eu estava em Brasília trabalhando como chefe da Divisão de Operações do CINDACTA I, um órgão regional semelhante ao SRPV-SP, mas com atuação na região central, na capital do país.
Depois dessa experiência moramos por dois anos na Argentina, onde tive a oportunidade de realizar o curso de Comando e Estado Maior na Força Aérea Argentina e de trabalhar na embaixada do Brasil, entre 2015 e 2016. Em janeiro de 2017, voltei para o Brasil, sendo instrutor da Escola de Comando e Estado Maior da Aeronáutica - ECEMAR.
Na seleção para o comando do SRPV-SP eu fui designado, em dezembro de 2017, para assumir esse importante cargo e permanecerei até o fim deste ano.
ASAGOL - Como foi receber o convite para ser chefe do SRPV-SP?
Cel. Av. Turola - Uma satisfação pessoal e profissional. Ser chefe do SRPV-SP é comandar uma organização Regional do Sistema de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro responsável pelo maior volume de tráfego de todo o Brasil. Inclui os terminais do Rio de Janeiro e de São Paulo, com as rotas aéreas que interligam as duas capitais, que denominamos como o nosso famoso “tubulão”.
Comandar um órgão regional é maior do que qualquer outra experiência que eu tive nessa área, pois tenho oito destacamentos subordinados e um efetivo total na faixa de 1200 militares e civis.
Recebi essa grande responsabilidade do chefe do subdepartamento de operações do DECEA (Departamento de Controle do Espaço Aéreo), ratificado posteriormente pelo alto comando da aeronáutica. É um desafio enorme, mas graças ao profissionalismo, empenho e dedicação de toda a equipe, nós estamos conseguindo alcançar grandes resultados.
ASAGOL - Você mencionou a amplitude do SRPV-SP e sua atuação, qual a importância do órgão para a aviação brasileira?
Cel. Av. Turola - O SRPV-SP completou 72 anos de existência no dia 27 de junho. Dos 12 maiores aeroportos do Brasil, o SRPV-SP é responsável por sete deles, com destaque para Guarulhos, Congonhas e Viracopos, em São Paulo, e Galeão e Santos Sumont, no Rio de Janeiro.
É responsável por todo o controle da ponte aérea Rio-São Paulo, que completou 60 anos em 2019 e que, em 2018, foi a quarta rota aérea mais voada em todo o planeta. Esses fatores mostram o tamanho da responsabilidade do SRPV-SP e sua importância para a aviação brasileira.
O volume intenso é o grande diferencial da área de jurisdição do SRPV-SP, pois ele atende a 30% de toda a atividade da aviação brasileira em um espaço de apenas 1,5% do território nacional. Uma pequena área para um fluxo enorme.
ASAGOL - Qual a principal missão do SRPV-SP?
Cel. Av. Turola - O SRPV-SP e as demais organizações de controle do espaço aéreo, como o próprio nome diz, atuam para organizar as atividades aéreas. Toda essa organização gira, tanto a parte técnica, operacional e administrativa, para dar suporte à aviação e todas as suas categorias (militar, civil, geral, helicópteros etc).
Todas as aeronaves precisam ser acomodadas dentro do nosso espaço aéreo, na máxima harmonia, trazendo assim a segurança necessária para as operações, com seu volume e pontualidade respeitados.
Devido à essa importância, o time todo precisa estar alinhado e comprometido para dar o suporte. Equipamentos e áreas técnicas funcionando perfeitamente, oferecendo meios para que o controlador possa exercer o seu trabalho da melhor forma, com a máxima segurança e sinergia.
ASAGOL - Como você vê o reconhecimento do Brasil internacionalmente na área de controle do tráfego aéreo?
Cel. Av. Turola - O Brasil, por conta desse trabalho em equipe bem executado por todas as organizações, é reconhecido internacionalmente como um dos espaços aéreos de maior segurança para se voar em todo o planeta. É signatário da ICAO desde a sua criação, durante a Convenção de Chicago em 1944.
Fazemos parte do grupo de elite dos países signatários da ICAO, o Brasil sempre esteve nesse conselho.
Seguimos toda a regulamentação, com nível de excelência reconhecido nessa área do espaço aéreo. Somos referência nesse trabalho.
ASAGOL - Quais foram as metas nesses quase dois anos à frente do SRPV-SP?
Cel. Av. Turola - Para uma organização dessa complexidade, a principal meta é conseguir buscar o máximo de sinergia entre todos os integrantes da nossa equipe. Fazer com que todos entendam que somos um time, com objetivos definidos, metas bem direcionadas e alinhamento para conseguir somar esforços e cumprirmos nossa missão da melhor forma possível. Do ponto de vista humano, fortalecer o trabalho em equipe foi a minha grande meta e com certeza conseguimos esse objetivo na nossa organização.
Já na parte técnica, proporcionamos maior disponibilidade dos equipamentos de suporte a todo o sistema de controle do espaço aéreo, incluindo meteorologias e comunicações.
No âmbito operacional, continuamos mantendo o foco no cumprimento da missão, serviço de controle, meteorologia e comunicação a todos os usuários do espaço aéreo brasileiro, sempre considerando o elevado nível de segurança das operações.
ASAGOL - Então o balanço até o momento nesse período frente ao SRPV-SP é positivo?
Cel. Av. Turola - Sim, eu faço um balanço muito positivo. Contribuímos para elevar a moral da equipe, melhorias de infraestrutura e projetos já concluídos, ou muito próximos disso.
Podemos citar a nova modelagem de toda a Terminal São Paulo (TMA-SP NEO), a maior terminal de tráfego aéreo da América Latina, gerando mais fluidez e capacidade ao tráfego aéreo. O Projeto AGILE-GRU, que trouxe melhorias na operação do Aeroporto de Guarulhos, com operações simultâneas, de pouso e decolagem, nas duas pistas do aeroporto. Nessa mesma linha, iniciamos o projeto o AGILE-RIO, que trará melhorias nos dois aeroportos da cidade proporcionando maior fluidez ao tráfego aéreo.
No dia 18 de outubro faremos a inauguração e ativação da torre de controle remota na base aérea de Santa Cruz. Essa será a primeira torre virtual de todo o hemisfério sul a entrar em operação. Equipamentos de câmeras de alta definição, um conceito que poderá gerar a ampliação desse serviço para mais aeroportos.
ASAGOL - Como você projeta o próximo biênio do SRPV-SP, com a troca de comando?
Cel. Av. Turola - A próxima gestão será conduzida pelo Cel. Av. Ciccacio, nosso atual chefe da Divisão de Operações, que participou ativamente de todos esses projetos. Temos a certeza que estamos em um caminho certo, de melhoria continua, e ele tem plena capacitação para dar continuidade a esse trabalho, valorizando o cumprimento da missão da nossa organização.
Será mais um período de busca por melhorias, evolução, mantendo a posição de destaque perante o espaço aéreo brasileiro do SRPV-SP.
Além de ajudar o DECEA a manter o Brasil como referência internacional na área de controle de tráfego aéreo.
Confira a galeria de fotos da carreira do Cel. Av. Turola, todas as imagens gentilmente cedidas por ele:
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